Para podermos entender a influência da Língua indígena Tupi na Língua Portuguesa, falada no Brasil, vamos ter que relembrar um pouco da história do nosso país.
Quando o navegador português, Pedro Álvares de Cabral, aportou em terras brasileiras em 1500, o Brasil tinha nos tupi-guaranis a tribo mais numerosa e poderosa. Os tupis viviam no litoral brasileiro, de norte a sul do que é hoje o Brasil. Já seus primos guaranis dominavam as matas do interior, entre as bacias do Paraná e do Paraguai.
A palavra "Tupi" significa "o grande pai" ou "líder" e o "Guarani" significa "guerreiro". Os tupis, dividiam-se em várias tribos. Algumas delas.
Tela de Assis Costa artista portigua
Os Potiguares (Papa-Camarão) viviam no Rio Grande do Norte. Mais ao sul, os Caetés (gente da floresta), vagavam por Alagoas. Os Tupinambás (Tupis Machos) eram da Bahia, e se uniram aos franceses e tamoios na guerra contra os lusitanos. Já em Porto Seguro, sul da Bahia, e descendo para o sul, já se encontravam os Tupiniquins, inimigos mortais dos Tupinambás.
Descendo o mapa do litoral brasileiro, encontravam-se as seguintes tribos tupis, tamoios (Os anciãos) de Cabo Frio até Angra dos Reis, guaianases (Os irmãos) São Vicente, SP, guaranis (guerreiros) de Itanhaém até Cananéia, SP, carijós (Os brancos), que se espalhavam por Cananéia, Santa Catarina até a Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul.
Padre jesuíta espanhol José de Anchieta
José de Anchieta, que viveu 44 anos no Brasil, aprendeu o tupi-guarani com os índios guaianases, de São Paulo. Foi nessa região que os padres jesuítas fundaram em 1554 um colégio, onde indígenas das redondezas passaram a morar e muitas crianças nativas frequentavam as aulas dos padres. Era o nascimento da cidade de São Paulo, situado em "Pindorama", nome que os índios chamavam o país que, mais tarde, por influência dos portugueses, passou a ser denominado "Brasil".
O Tupi-guarani não formava uma língua uniforme. Os padres jesuítas que montaram aldeias ou "missões" arrebanhando os nativos para o ensino da fé católica acabaram influenciando os índios Tupi-guaranis "domesticados" a falarem um tupi padrão e simplificado. O objetivo era eliminar os dialetos. O tupi patronizado ganhou o nome de "Nheengatu", que significa "Língua Boa". Também é conhecido por "Abanheenga", que significa "Língua de Gente". O Nheengatu é a língua ainda hoje falada na Amazônia.
Até o final do século XVII, a língua "oficial" do Brasil era o Tupi-guarani misturado com português. De cada três brasileiros, dois só falavam Tupi-Guarani. Mas em 1759, sobre influência do Marquês de Pombal, o governo português baixou um decreto proibindo o uso do idioma sob a acusação de que estava prejudicando as comunicações na colônia brasileira e impondo punições para quem não usasse o idioma português. Foi assim que, à força, o tupi-guarani foi tirado de circulação ao longo do tempo. Se não houvesse essa medida, o Brasil seria um país bilíngue, cuja população usaria o português e o tupi-guarani, tal como hoje ocorre no Paraguai em que o povo de lá exprime-se em espanhol e guarani, uma língua parente do tupi.
O tupi-guarani influenciou profundamente o português do Brasil. Não foi apenas na incorporação de vocabulário indígena, mas até mesmo influenciou na sintaxe no idioma lusitano no Brasil. Aliás, vale lembrar que os caboclos do estado de São Paulo, em sua grande maioria, só falava tupi até a primeira metade do século XIX.
Alguns exemplos da influência do tupi-guarani no português brasileiro.
Raros são os brasileiros que pronunciam o "r" de final de palavras. Por exemplo, "pagar" é falado como "pagá", "amor" soa a "amô" e assim vai. Pois esse vício de linguagem vem do tupi-guarani. As pessoas menos escolarizadas têm o costume de trocar o "l" pelo "i". Não pronunciam "mulher", mas "muié", "pólvora" soa a "pórvora", "filho" é "fio", etc.
Os paulistas dizem- está chovendo, me deixe, me faça o favor, etc., enquanto os portugueses locucionam- está a chover, construção tão malsoante aos nossos ouvidos, quanto aos ouvidos lusos devem ser os- me deixe, me faça o favor.
Há tantas palavras tupi incorporadas ao português que nem percebemos, inclusive até na gíria de jovens. Por exemplo, há jovens que dizem: "O fulano chegou no serviço e BABAU. Perdeu o emprego". O "Babau", que muitos acham ser uma gíria de surfista, é uma expressão secular do tupi-guarani, que significa "acabou-se".
"Tchê" é outro sinônimo tupi-guarani que significa "amigo". Também significa "eu" e "meu". Mas esta palavra tão usada pelos gaúchos incorporou-se tanto no português do Rio Grande do Sul como no espanhol dos argentinos e uruguaios dos pampas fronteiriços ao Brasil por influência também do guarani do Paraguai. Aliás, o famoso guerrilheiro argentino que participou da revolução cubana, Ernesto Guevara, que morreu na Bolívia em 1967, era chamado de "Che" (como é escrito "Tchê" no espanhol). Portanto, Che Guevara significa "Amigo Guevara", que a história imortalizou como símbolo da rebeldia e da luta revolucionária esquerdista.
Outras palavras que conhecemos, mas muitas vezes não sabemos o significado e que provinham do Tupi
Andaraí: água do morcego Anhangabaú: buraco do diabo
Aracaju: tempo de caju Carioca: casa de branco
Curitiba: muito pinhão, pinheiral Goiás: gente da mesma raça
Ipanema: água suja Jacarepaguá: lago do jacaré
Mogi-Mirim: riacho das cobras Pará: mar
Paraguai: rio do papagaio Paraíba: rio ruivo ou encachoeirado
Paraná: rio afluente Pirapora: peixe que salta
Pindorama: país das palmeiras Sergipe: rio dos siris
Tijuca: água podre
Fica a dica: vamos nos atentar mais, porque tudo isso não só faz parte da nossa língua, mas da nossa história, da nossa cultura, faz parte de nós brasileiros.
Editado por Andréa Beliato